Mário de Andrade
Mário Raul de Morais Andrade (São Paulo, 9 de outubro de 1893 — São Paulo, 25 de fevereiro de 1945) foi um poeta, romancista, musicólogo, historiador de arte, crítico e fotógrafo brasileiro. Um dos fundadores do modernismo no país, ele praticamente criou a poesia brasileira moderna com a publicação de sua Pauliceia Desvairada em 1922. Ele teve uma influência enorme na literatura brasileira moderna e, como estudioso e ensaísta, foi pioneiro no campo da etnomusicologia. Sua influência chegou muito além do Brasil.
Andrade foi a figura central do movimento de vanguarda de São Paulo por vinte anos. Treinado como músico e mais conhecido como poeta e romancista, Andrade se envolveu pessoalmente em praticamente todas as disciplinas relacionadas ao modernismo paulistano e se tornou o polímata nacional do Brasil. Suas fotografias e ensaios sobre uma ampla variedade de assuntos, da história à literatura e à música, foram amplamente publicados.
Ele foi a força motriz por trás da Semana de Arte Moderna, o evento de 1922 que reformulou a literatura e as artes visuais no Brasil, e um membro do vanguardista “Grupo dos Cinco”. As ideias por trás da semana foram exploradas no prefácio de sua coleção de poesia Pauliceia Desvairada e nos próprios poemas.
Depois de trabalhar como professor de música e colunista de jornal, publicou seu grande romance, Macunaíma, em 1928. Os trabalhos sobre música folclórica brasileira, poesia e outras temáticas foram seguidos de maneira desigual, muitas vezes interrompidos pela mudança na relação de Andrade com o governo brasileiro. No final de sua vida, ele se tornou o diretor fundador do Departamento de Cultura de São Paulo, formalizando um papel que exercia há muito tempo como catalisador da entrada da cidade – e da nação – na modernidade artística.
Juventude
Mário de Andrade nasceu em São Paulo, cidade onde morou durante quase toda a vida no número 320 da Rua Aurora, onde seus pais, Carlos Augusto de Andrade e Maria Luísa de Almeida Leite Moraes de Andrade, também haviam morado. Durante sua infância foi considerado um pianista prodígio, tendo sido matriculado no Conservatório Dramático e Musical de São Paulo em 1911. Recebeu educação formal apenas em música, mas foi autodidata em história, arte, e especialmente poesia. Dominava a língua francesa, tendo lido Rimbaud e os principais poetas simbolistas franceses durante a infância.
Em 1913, seu irmão Renato, então com quatorze anos de idade, morreu de um golpe recebido enquanto jogava futebol, o que causou um profundo choque em Andrade. Ele abandonou o conservatório e se retirou com a família para uma fazenda que possuíam em Araraquara. Ao retornar, sua habilidade de tocar piano havia sido afetada por um tremor nas mãos. Embora ele houvesse se formado no Conservatório, ele não se apresentou mais e começou a estudar canto e teoria musical com a intenção de se tornar um professor de música. Ao mesmo tempo, começou a ter um interesse mais sério pela literatura. Em 1917, ano de sua formatura, publicou seu primeiro livro de poemas, Há uma Gota de Sangue em Cada Poema, sob o pseudônimo de Mário Sobral. O livro contém indícios de uma crescente percepção do autor em relação a uma identidade particularmente brasileira, mas, assim como a maior parte da poesia brasileira produzida na época, o faz num contexto fortemente ligado à literatura europeia—especialmente francesa.
Seu primeiro livro parece não ter tido um impacto significativo e Andrade decidiu ampliar o âmbito de sua escrita. Deixou São Paulo e viajou para o campo. Iniciou uma atividade que continuaria pelo resto da vida: o meticuloso trabalho de documentação sobre a história, o povo, a cultura e especialmente a música do interior do Brasil, tanto em São Paulo quanto no Nordeste. Andrade também publicou ensaios em jornais de São Paulo, algumas vezes ilustrados por suas próprias fotografias, e foi, acima de tudo, acumulando informações sobre a vida e o folclore brasileiro. Entre as viagens, Andrade lecionava piano no Conservatório, havendo sido também, conforme relato de Oneyda Alvarenga, aluno de estética do poeta Venceslau de Queirós, sucedendo-lhe como professor no Conservatório após sua morte em 1921. Mário de Andrade compôs uma única canção, intitulada “Viola Quebrada”.
Carreira
Semana de Arte Moderna
Mário de Andrade (primeiro à esquerda, no alto), Rubens Borba de Moraes (sentado, segundo da esquerda para a direita) e outros modernistas em 1922, dentre os quais (não identificados) Tácito, Baby, Mário de Almeida e Guilherme de Almeida e Yan de Almeida Prado
Enquanto essas viagens de coleta de folclore aconteciam, Andrade desenvolveu um grupo de amigos entre jovens artistas e escritores de São Paulo, que, como ele, conheciam o crescente movimento modernista na Europa. Vários deles foram posteriormente conhecidos como Grupo dos Cinco: o próprio Andrade, os poetas Oswald de Andrade (sem parentesco) e Menotti del Picchia, e as artistas Tarsila do Amaral e Anita Malfatti, sendo que a última esteve na Europa antes da Primeira Guerra Mundial e apresentou São Paulo ao expressionismo. Jack E. Tomlins, tradutor do segundo livro de Andrade, descreve em sua introdução um evento particularmente crucial no desenvolvimento da filosofia modernista de Andrade. Em 1920, ele conheceu o escultor modernista Victor Brecheret e comprou uma escultura intitulada “Busto de Cristo”, que descrevia Cristo como um brasileiro de cabelos trançados. Sua família (aparentemente para sua surpresa) ficou chocada e furiosa. Andrade retirou-se para seu quarto sozinho e depois lembrou, em uma palestra traduzida por Tomlins, que – ainda “delirante” – saiu para a varanda e “olhou para a praça abaixo sem realmente vê-la”.
Ruídos, luzes, as brincadeiras ingênuas dos taxistas: todos flutuaram até mim. Eu estava aparentemente calmo e não pensando em nada em particular. Não sei o que de repente aconteceu comigo. Fui até minha mesa, abri um caderno e anotei um título que nunca havia passado pela minha cabeça: Pauliceia Desvairada. Esses poemas eram completamente diferentes de seu trabalho formal e abstrato. As linhas dos versos variam muito em comprimento e estrutura sintática, consistindo principalmente de descrições impressionistas e fragmentadas, intercaladas com trechos de fala aparentemente ouvidos e desconectados no dialeto de São Paulo. O falante dos poemas muitas vezes parece dominado pelo labirinto de diálogos que o interrompe constantemente, como em “Colloque Sentimental”:
A rua toda nua … As casas sem luzes …
E a mirra dos martírios inconscientes…
Deixe-me pôr o lenço no nariz.
Tenho todos os perfumes de Paris!
Depois que os poemas foram concluídos, Andrade escreveu o que chamou de “Prefácio Extremamente Interessante”, em uma tentativa de explicar retrospectivamente o contexto teórico dos poemas (embora Bruce Dean Willis tenha sugerido que as teorias do prefácio têm mais a ver com o seu trabalho posterior do que com Pauliceia0). O prefácio é autodepreciativo (“Este prefácio – embora interessante – é inútil”), mas ambicioso, apresentando uma teoria não apenas da poesia, mas da estética da linguagem, a fim de explicar as inovações de seus novos poemas. Andrade explica seu emaranhado de linguagem em termos musicais:
Existem certas figuras de linguagem em que podemos ver o embrião da harmonia oral, assim como encontramos o germe da harmonia musical na leitura das sinfonias de Pitágoras. Antítese: dissonância genuína.
Ele faz uma distinção, no entanto, entre linguagem e música, no sentido de que “as palavras não são fundidas como notas; na verdade, elas são embaralhadas e se tornam incompreensíveis”. No entanto, como Willis apontou, há um pessimismo no prefácio; em uma de suas principais passagens, compara a poesia às riquezas submersas de El Dorado, que nunca podem ser recuperadas.
Em 1922, enquanto preparava Pauliceia Desvairada para publicação, Andrade colaborou com Malfatti e Oswald de Andrade na criação de um único evento que iria introduzir seu trabalho para o público em geral: a Semana de Arte Moderna. A Semana incluiu exposições de pinturas de Malfatti e outros artistas, leituras e palestras sobre arte, música e literatura. Andrade foi o principal organizador e a figura central do evento, que foi recebido com ceticismo, mas teve boa participação. Ele deu palestras sobre os princípios do modernismo e seu trabalho na música folclórica brasileira e leu seu “Prefácio Extremamente Interessante”. Como o clímax da Semana, ele leu Pauliceia Desvairada. O uso de versos livres e expressões coloquiais de São Paulo pelos poemas, embora relacionados a poemas modernistas europeus do mesmo período, eram inteiramente novos para os brasileiros. A leitura foi acompanhada de zombarias persistentes, mas Andrade perseverou e depois descobriu que grande parte da plateia a considerava transformadora. Este tem sido citado frequentemente como o evento seminal na literatura brasileira moderna.
O Grupo dos Cinco continuou trabalhando juntos na década de 1920, período em que sua reputação se solidificou e a hostilidade ao trabalho diminuiu gradualmente, mas eventualmente o grupo se separou; Andrade e Oswald de Andrade tiveram uma briga séria (e pública) em 1929.
“O Turista Aprendiz”
Ao longo da década de 1920, Andrade continuou viajando pelo Brasil, estudando a cultura e o folclore do interior. Ele começou a formular uma teoria sofisticada das dimensões sociais da música folclórica, que é ao mesmo tempo nacionalista e profundamente pessoal. O tema explícito de Andrade era a relação entre a música “artística” e a música da rua e do campo, incluindo os estilos afro-brasileiro e ameríndio. O trabalho foi controverso por suas discussões formais sobre música folclórica; essas controvérsias foram agravadas pelo estilo de Andrade, que era ao mesmo tempo poético (Luper chama de “Joyceano”) e polêmico.
Suas viagens pelo Brasil se tornaram mais do que apenas pesquisas; em 1927, começou a escrever um diário de viagem chamado “O turista aprendiz” para o jornal O Diario Nacional. A coluna serviu de introdução aos cosmopolitas ao Brasil indígena. Ao mesmo tempo, serviu de propaganda para o trabalho de Andrade. Várias fotografias de Andrade foram publicadas ao lado da coluna, mostrando a paisagem e as pessoas. Ocasionalmente, o próprio Andrade aparecia neles, geralmente filtrado pela paisagem. Suas fotografias serviram assim para promover seu projeto modernista e seu próprio trabalho, ao mesmo tempo que sua função de registrar folclore.
… Os objetos, os desenhos, as fotografias que pertencem à minha existência de algum dia no passado, para mim, retém sempre uma enorme força para a reconstituição da vida. Ao vê-los, não me lembro simplesmente, mas revivo a mesma sensação e o mesmo velho estado, no dia em que já o experimentei …
Embora Andrade tenha continuado fotografando ao longo de sua carreira, essas imagens dos anos 1920 representam a maior parte de seu notável trabalho, sendo a série de 1927 de particular importância. Ele estava especialmente interessado na capacidade das fotografias de capturar ou reafirmar o passado, um poder que ele considerava altamente pessoal. No final dos anos 1930, ele escreveu:
Em muitas das imagens, as figuras são sombreadas, borradas ou quase invisíveis, uma forma de retrato que para Andrade se tornou uma espécie de sublime modernista.
Para saber mais sobre Mario de Andrade e suas obras, visite o site:
“ https://pt.wikipedia.org/wiki/M%C3%A1rio_de_Andrade ” de onde parte deste material foi retirado.
Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.